quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Ser Professor

"Ser professor é ser artista
malabarista,
pintor, escultor, doutor,
musicólogo, psicólogo...

É ser mãe, pai, irmã, avó,
é ser palhaço, bagaço...
É ser ciência e paciência...
É ser informação.

É ser acção,é ser bússola, é ser farol.
É ser luz, é ser sol.
Incompreendido?... Muito.
Defendido? Nunca.

O seu filho passou?...
Claro, é um génio.
Não passou?
O professor não ensinou.

Ser professor
é um vício ou vocação?
É outra coisa...
É ter nas mãos o mundo de amanhã.

Amanhã.
Os alunos vão-se...
E ele, o mestre, de mãos vazias,
fica com o coração partido.

Recebe nova turmas,
novos olhinhos ávidos de cultura
e ele, o professor, vai despejando
com toda a ternura, o saber, a orientação
nas cabecinhas novas que amanhã
luzirão no firmamento da pátria.

Fica a saudade
A amizade.
O pagamento real?
Só na eternidade."


Autor anónimo, professor da UNL, (segundo o site da Direcção Regional da Educação dos Açores). Recebida em comentário de blogue.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Aos poetas

"Somos nós
As humanas cigarras.
Nós,
Desde o tempo de Esopo conhecidos...
Nós,
Preguiçosos insectos perseguidos.

Somos nós os ridículos comparsas
Da fábula burguesa da formiga.
Nós, a tribo faminta de ciganos
Que se abriga
Ao luar.
Nós, que nunca passamos,
A passar...

Somos nós, e só nós podemos ter
Asas sonoras.
Asas que em certas horas
Palpitam.
Asas que morrem, mas que ressuscitam
Da sepultura.
E que da planura
Da seara
Erguem a um campo de maior altura
A mão que só altura semeara.

Por isso a vós, Poetas, eu levanto
A taça fraternal deste meu canto,
E bebo em vossa honra o doce vinho
Da amizade e da paz.
Vinho que não é meu,
Mas sim do mosto que a beleza traz.

E vos digo e conjuro que canteis.
Que sejais menestréis
Duma gesta de amor universal.
Duma epopeia que não tenha reis,
Mas homens de tamanho natural.

Homens de toda a terra sem fronteiras.
De todos os feitios e maneiras,
Da cor que o sol lhes deu à flor da pele.
Crias de Adão e Eva verdadeiras.
Homens da torre de Babel.

Homens do dia-a-dia
Que levantem paredes de ilusão.
Homens de pés no chão,
Que se calcem de sonho e de poesia
Pela graça infantil da vossa mão."


Miguel Torga

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Marião

"Adeus oh Vale de Gouvinhas, Marião
Não és vila nem cidade, Marião
Sim, sim Marião
Não,Não Marião

És um povo pequenino, Marião
Feito à minha vontade, Marião
Sim, sim Marião
Não,Não Marião

Hei-de cercar Vale Gouvinhas, Marião
Com trinta metros de fita, Marião
Sim, sim Marião
Não,Não Marião

À porta do meu amor, Marião
Hei-de pôr a mais bonita, Marião
Sim, sim Marião
Não,Não Marião

Os meus olhos não são olhos, Marião
Sem estarem os teus de fronte, Marião
Sim, sim Marião
Não,Não Marião

Parecem dois rios de água, Marião
Quando vão de monte em monte, Marião
Sim, sim Marião
Não,Não Marião

Já corri os mares em volta, Marião
Com uma vela branca acesa, Marião
Sim, sim Marião
Não,Não Marião

Em todo o mar achei água, Marião
Só em ti pouca firmeza, Marião
Sim, sim Marião
Não,Não Marião"

(Letra e música popular interpretada por Brigada Victor Jara)

domingo, 5 de setembro de 2010

Cavalo à Solta

Minha laranja amarga e doce
meu poema
feito de gomos de saudade
minha pena
pesada e leve
secreta e pura
minha passagem para o breve breve
instante da loucura.

Minha ousadia
meu galope
minha rédea
meu potro doido
minha chama
minha réstia
de luz intensa
de voz aberta
minha denúncia do que pensa
do que sente a gente certa.

Em ti respiro
em ti eu provo
por ti consigo
esta força que de novo
em ti persigo
em ti percorro
cavalo à solta
pela margem do teu corpo.

Minha alegria
minha amargura
minha coragem de correr contra a ternura.

Por isso digo
canção castigo
amêndoa travo corpo alma amante amigo
por isso canto
por isso digo
alpendre casa cama arca do meu trigo.

Meu desafio
minha aventura
minha coragem de correr contra a ternura.


José Carlos Ary dos Santos